Já ouvi dizer que todo mundo nessa vida tem um sósia. Alguém que é parecidíssimo, por que não dizer, igualzinho?, o que às vezes causa algumas confusões. Bem, já fui vítimas dessas confusões, não uma, mas... várias vezes. E como tudo o que acontece de engraçado comigo... nas idas e vindas do trabalho, mais precisamente nas vindas. Pois um belo dia vinha eu, depois de um dia de intensa labuta - é, porque ao contrário do que a maioria pensa, trabalhar na biblioteca não é sinônimo de ficar lendo o dia todo sem fazer nada – e...
Quando chego próximo ao ponto da circular para o Sumaré, percebo que alguém vem um tanto quanto apressado atrás de mim. Olho. Uma moça já vem caminhando ao meu lado. Ela me olha, sem jeito, olha de novo e abre o maior sorrisão. Como sou uma pessoa educada e amistosa, retribuí o sorriso. E cumprimentei. E aí vem a pergunta:
- Por que você não foi à igreja no domingo?
Uma certa culpa me atingiu: eu não tinha ido à igreja, nem naquele domingo, nem no anterior. Sou um pouco (um pouco?) relaxada em matéria de igreja!
- Na igreja? – indaguei, pensando no que lhe diria.
- É, a missa tava ótima. O padre do Sumaré não estava, mas veio outro, e...
Epa, peraí, Sumaré? Nunca fui à missa no Sumaré. Moro muito distante desse bairro! Então me dei conta de que a minha interlocutora provavelmente me confundia com alguém.
- Acho que você está me confundindo com alguém... – me expliquei humildemente - Nunca fui à missa no Sumaré, moro no Santos Dumont. – a jovem me olhou bem:
- Será? Não é você, que sempre vai à missa no Sumaré? Tem certeza?
”Não”, pensei, “não tenho certeza. Pode ser que eu tenha estado lá missa numa de minhas crises de sonambulismo. Ou amnésia, apesar de que nunca tive conhecimento de sofrer dessas crises.”
- Tenho, sim. – afirmei. – Talvez seja alguém parecida comigo.
- Mas que coisa! – exclamou a moça – Não é você então? Mas você é a cara dela!
Já sem graça por não ser a tal pessoa, imaginei com certa preocupação como seria essa minha sósia. Deu até medo. Mas tudo bem, seguimos conversando um pouco mais – a moça me disse que já fizera tratamento no CAPS – mas que estava bem melhor, felizmente. Ainda bem, pensei.
Vai daí que até esqueci o incidente. Meses depois eu vinha do trabalho (esse é o momento maravilhoso em que me acontece cada coisa...) e eis que lá vem a mesma jovem, dessa vez acompanhada por uma amiga. Me encontra. Sorri. Ah, pensei – ela me reconheceu e lembrou do engano. Mas lá vem a frase:
- Oi, você foi à igreja no domingo?
Ah, meus Deus, deve ser um anjo justiceiro que Deus mandou para me cobrar pelas minhas faltas à missa. Acho que vou ter que freqüentar mais a igreja.
- Não, respondi, não sou a pessoa que você tá pensando. Um dia você já me confundiu, lembra? É alguém parecida comigo.
Ela olhou para a amiga, que assistia a tudo sem entender nada:
- Nossa. Você viu, como ela se parece com aquela mulher que senta lá no banco da frente? Aquela, que está em todas as missas!
Acho que a amiga dela não concordou muito, pois sorriu meio amarelo. Bem, pensei, pelo menos minha sósia freqüenta a igreja sempre e ainda senta no banco da frente. Imagina se ela frequentasse outros lugares menos conceituados e me confundissem com ela?
Conversamos mais um pouco e nos separamos.
Mas... Há cerca de quinze dias eu, em minhas fantásticas vindas do trabalho, passei pelo mesmo bat ponto do Sumaré, na mesma bat hora... e um senhor que esperava pelo ônibus me olha. Um senhor de meia-idade, que eu não conhecia. E quando me aproximo solta a pergunta:
- Seu marido ainda trabalha com caminhão?
Pronto. Além de ser beata agora tenho um marido caminhoneiro. Olhei bem para ele.
- Não, senhor. O senhor deve estar enganado. Não tenho marido caminhoneiro.
Bem, pensei, na verdade nem marido tenho – nem caminhoneiro, nem motoqueiro, motorista de ônibus ou de qualquer outra profissão. Felizmente ou infelizmente. O homem me olhou bem:
- Nossa, mas como você se parece tanto com ela!
Sorriso amarelo, balbucio um vago “é, já me confundiram de outras vezes”, disfarço, dou um "Boa Noite" em despedida e continuo o meu caminho para casa.
Mas o pior mesmo foi num dia em que eu vinha para meu lar, adivinha de onde? (Começa com B e tem muitos livros). E encontro o João Matador, figura famosa na cidade, sujeito meio (meio???) avariado das idéias que anda pela rua falando alto e em suas crises sai dizendo que “vai matar, vai enfiar a faca no bucho, vai sangrar” – Pois o agradabilíssimo sujeito me olha de cima a baixo e profere em alto e bom tom:
- Você ainda faz programa lá em Alto Paraná ? Eu vi você lá em Alto Paraná , sua piranha (numa expressão um pouco menos delicada, citando os locais onde eu deveria pretensamente exercer tais ofícios). Fiquei verde, vermelha e roxa, e andei o mais rápido que pude. Ele continuou falando algumas coisas que eu preferi nem ouvir. E para isso contribuiu o fato de que andei mais depressa do que velocidade do som.
O fato é que não sei se a minha sósia cansou da vida de senhora religiosa e freqüentadora de missas e decidiu tentar uma vida mais animada, ou seu eu tenho uma outra sósia de vida um pouco mais liberada do que ela, lá pras bandas de Alto Paraná. Mas até hoje quando vejo o João Matador me dá uma batedeira! Desvio por quarteirões e corro o mais que posso para evitar encontrá-lo. Sabe-se lá o que ele vai me dizer! E o pior é que eu nem conheço Alto Paraná, e agora nem quero conhecer, já pensou? Eu lá, andando distraidamente pela rua, de repente um homem me aborda com um olhar safado e diz: "Topas outro programa como o de ontem?" Ainda bem que o curso de Atendente de Biblioteca foi em Nova Esperança! Ah, mas que tenho vontade de conhecer minha(s) sósias, isso eu tenho!
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